Diabetes na prática clínica é um e-book disponibilizado pela SBD (Sociedade Brasileira de Diabetes). Consta de 4 módulos, dos quais apresentaremos aqui parte do módulo 4, em várias postagens para não ficar um texto muito extenso.
Dr. Marcos A. Tambascia (Chefe da Disciplina de Endocrinologia do Departamento de Clínica Médica da UNICAMP/SP) é autor do capítulo 1, aqui exposto parcialmente por hora, mas disponibilizado na íntegra nas próximas postagens.
Dr. Marcos A. Tambascia (Chefe da Disciplina de Endocrinologia do Departamento de Clínica Médica da UNICAMP/SP) é autor do capítulo 1, aqui exposto parcialmente por hora, mas disponibilizado na íntegra nas próximas postagens.
Visão geral dos antidiabéticos orais tradicionais: secretagogos, inibidores da alfa-glicosidase e sensibilizadores de insulina
O controle da hiperglicemia em longo
prazo é essencial para a manutenção de qualidade de vida e prevenção das
complicações crônicas, tanto micro como macrovasculares. Muitos
pacientes no início da doença acreditam que a ausência de sintomas
significa bom controle.
Esse é um dos motivos pelo qual as
equipes cuidadoras precisam estimular que pacientes com diabetes tipo 2
se acostumem com a auto-monitorização e com a necessidade de atingir
alvos glicêmicos e metabólicos definidos pela equipe. O processo de
controle envolve a necessidade de mudança do estilo de vida, manutenção
de peso ideal e o uso de agentes antidiabéticos. A escolha de cada
agente se faz em função de seu mecanismo de ação, de características da
fisiopatologia de cada caso no momento, de eventos colaterais,
facilidade ao paciente e custo. Aqui trazemos as características
principais de cada agente oral tradicional e seus principais efeitos
colaterais.
Secretagogos
Entre os medicamentos orais para o
tratamento do diabetes mellitus tipo 2 a classe dos secretagogos de
insulina estão entre os mais utilizados, embora a maioria das
recomendações das sociedades médicas preconize a utilização inicial de
sensibilizadores como a metformina. Esta classe é representada pelas
sulfoniluréias e pelas glinidas. Elas agem estimulando a secreção de
insulina pelas células beta pancreáticas e estão, em princípio,
indicadas para pacientes não obesos ou pacientes obesos cuja glicemia
não foi controlada por mudanças do estilo de vida e metformina.
A secreção de insulina é regulada por um
complexo mecanismo em que a glicose entra na célula beta através da
ação de um transportador específico, o GLUT2 e sua metabolização pela
glicólise fecha o canal de potássio levando a despolarização da membrana
celular, entrada do íon cálcio com mudança da carga elétrica e assim
liberação dos grânulos de insulina. Os medicamentos considerados como
secretagogos tradicionais se ligam ao SUR1, sub-unidade do canal de
potássio ATP dependente localizado na superfície da membrana da célula
beta e dessa interação ocorre uma inibição da outra sub-unidade, o
KIR6.2 que leva ao fechamento do canal de potássio e, assim,
despolarização da membrana.
As sulfoniluréias de modo geral têm uma
ligação lenta e efeitos prolongados na secreção de insulina. Eles não
corrigem integralmente o retardo da secreção de insulina relacionada à
refeição e continuam estimulando a secreção de insulina mesmo no estado
não relacionado à refeição. Estimulam assim a secreção da insulina no
estado pós-prandial e também no estado de jejum. De modo geral as
sulfoniluréias têm uma ação mais na glicemia de jejum do que na
pós-prandial. Como principais complicações temos a possibilidade de
indução de hipoglicemia e de ganho de peso. O ganho de peso está
relacionado ao efeito anabólico da insulina e das medidas para a
prevenção da hipoglicemia.
Os principais representantes das
sulfoniluréias são a glibenclamida, com dose útil de 2,5 a 20 mg/dia, a
glimepirida na dose de 1 a 8 mg/dia ,a gliclazida (dose de 40 a 320
mg/dia) e a gliclazida MR (30 a 120 mg/dia). Temos ainda a clorpropamida
(dose de 125 a 500 mg/dia), praticamente em desuso nos dias atuais. A
glibenclamida, clorpropamida e a gliclazida devem ser utilizadas em 1 a 2
tomadas ao dia e a gliclazida MR e a glimepirida em dose única.
Uma possível complicação com o uso de
sulfoniluréias é a inespecificidade das formulações mais antigas que
interagem também com o SUR2a, receptor encontrado em cardiomiócitos.
Esses medicamentos podem interferir no pré-condicionamento isquêmico.
Esse fenômeno é importante para diminuir a área infartada após eventos
isquêmicos transitórios. A glimepirida e a gliclazida MR não apresentam
esse inconveniente e teoricamente são mais seguras para pacientes com
doença coronariana prévia. Esses últimos medicamentos também estão
associados com menor ganho de peso e taxas de hipoglicemia menos
frequentes.
Outros medicamentos considerados como
secretagogos de insulina são as meglitinidas ou simplesmente glinidas.
São representadas pela nateglinida e pela repaglinida. Esses
medicamentos ligam-se a receptores específicos no SUR1 e têm como
característica principal uma capacidade de ligação mais rápida e com
dissociação também mais rápida. Como vantagem em relação às
sulfoniluréias estão sua ação mais rápida, e, portanto, menor
possibilidade de induzir hipoglicemia. Como principal desvantagem há a
necessidade de várias tomadas ao dia, prejudicando a aderência do
paciente ao tratamento.
Obs. As figuras não fazem parte do livro.